segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O Golpe Civil-Militar de 1964

Márcio Ramos


O regime militar instaurado em 1964 estendeu-se por 21 anos, nos quais a presidência da republica foi ocupada sucessivamente por generais do exército. Foi um período de forte repressão social, onde os militares impuseram à força o seu sistema de governo.
Essa é a visão que tradicionalmente é apontada como explicação para o que aconteceu no Brasil após a derrubada de João Goulart. Entretanto, é preciso relativizar essa expressão “regime militar”. Apesar dos presidentes-ditadores desse período serem militares, eles governaram apoiados por vários setores da sociedade civil, que viam nesse tipo de governo a possibilidade de ganhos econômicos e políticos, ao mesmo tempo em que se perseguia as ideias comunistas, vistas como a própria encarnação do  mal naqueles anos de Guerra Fria. O golpe foi civil e militar. Ele foi deflagrado por segmentos importantes da sociedade, como grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja Católica e por influentes governadores de estado.
O golpe foi uma resposta às tentativas de mudanças sociais do governo de João Goulart, as chamadas Reformas de Base. As reformas tinham por objetivo “acabar com o latifúndio(com a reforma agrária) e a presença do capital estrangeiro no país, conceder o voto aos analfabetos e aos soldados, proteger os assalariados e mudar radicalmente os padrões de ensino e aprendizagem, além de alterar o sistema bancário e estimular a chamada cultura nacional[1]”.
Diante dessas propostas, a classe média, os empresários, a mídia, a Igreja e os militares se unem para derrubar o governo democrático do Jango. Ocorrem então as famosas Marchas da Família com Deus pela Liberdade, que mobilizaram dezenas de milhões de pessoas contra o governo. Representavam o “medo” espalhado na sociedade. O medo das reformas que poderiam acabar com os privilégios sociais.
Como foi dito acima, o mundo estava em plena Guerra Fria e os Estados Unidos, que se julgavam “guardiões da democracia” no mundo, não queria aceitar a ideia de um governo mais de esquerda, ou seja, com projetos mais sociais, no Brasil. Achavam que o país estava a caminho do comunismo e por isso apoiaram o golpe. Havia um plano de contingência, elaborado em dezembro de 1963 pela embaixada dos EUA no Brasil que previa a ajuda americana. “A ‘operação Brother Sam’ deslocaria navios de guerra e petroleiros para as costas brasileiras, a fim de apoiar os golpistas em caso de guerra civil”[2].
Os jornais também apoiaram o golpe. “os comunistas invadiram o Brasil”. Era esta a impressão de qualquer leitor de jornais no inicio dos anos 1960[3]. Essas  manchetes, editoriais e matérias de vários jornais, como a Folha de São Paulo , O Globo, Correio da Manhã e o Estado de S. Paulo não tinham por objetivo a informação à sociedade, mas sim criar uma crise política que viesse desestabilizar e derrubar o governo de então. Quando o golpe ocorreu em 1º. de abril de 1964 esses jornais continuaram a apoiar a ditadura, a Folha chegou a afirmar que “não houve rebelião contra a lei. Na verdade, as Forças Armadas destinam-se a proteger a pátria e garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem”. O Estado de S. Paulo estampou a manchete: “Democratas dominam toda a Nação”.  O Correio Braziliense noticiava em 16 de abril a posse do primeiro general ditador: “Milhares de pessoas compareceram, ontem, às solenidades que marcaram a posse do marechal Humberto Castelo Branco na Presidência da República... O ato de posse do presidente Castelo Branco revestiu-se do mais alto sentido democrático, tal o apoio que obteve”. . Podemos concluir que os militares representavam o interesse de vários setores conservadores do Brasil.

Veja o que Daniel Aarão Reis sobre a cooperação entre civis e militares:

A ampla frente política e social que apoiou o golpe era bastante heterogênea. Muitos que dela participaram queriam apenas uma intervenção rápida. Que fosse brutal, mas rápida. Lideranças civis como Carlos Lacerda, Magalhães Pinto, Juscelino Kubitschek, Ademar de Barros, Ulysses Guimarães,  entre tantos outros, aceitavam ou queriam mesmo que os militares fizessem o “trabalho sujo” de prender e cassar, e depois, logo depois, fosse retomado o jogo tradicional, marginalizadas as forças de esquerda mais radicais. Não foi isso que aconteceu.[4]

Ao contrário do esperado os militares ficaram vinte e um ano no governo, em uma das piores ditaduras da América Latina. João Goulart foi deposto e partiu para o exílio. Tivemos cinco generais-presidentes, ditadores eleitos indiretamente pelo Congresso Nacional dominado. Mandaram e desmandaram no país durante todo esse tempo.




[1] REIS, Daniel Aarão. “O sol sem peneira”, In, Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 7, no. 83. Agosto de 2012.
[2] MARTINS FILHO, João Roberto. “O 1º. Abril”, In, Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 7, no. 83. Agosto de 2012
[3] DIAS, Luiz Antonio. “A Salvação da pátria”, In , Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 7, no. 83. Agosto de 2012
[4] REIS, Op. Cit.

Nenhum comentário:

Postar um comentário